22/04/2015

Hipocrisia: s.f.

 
Ato de fingir que se tem qualidades, ideias ou sentimentos que na realidade não se possui.

Sou uma pessoa de arquivos. Guardo jornais e revistas em datas importantes, quer pela notícia, quer pela data. Algumas dessas edições devidamente emolduradas ocupam os seus postos pelas paredes de minha casa. Mas para verem onde isto chega: já fui assídua da Torre do Tombo...e da Hemeroteca de Lisboa. É provável que me tenha passado ao lado uma grande carreira de arquivista, menos mal que ficou o "bichinho" do jornalismo.

Mais que uma mera profissão, o jornalismo sempre foi um ideal romântico para mim: Respeita-te a ti mesma, aos outros e ao Jornalismo!

Debitar textos é fácil, escrever uma reportagem é tão, mas tão difícil. A dificuldade é tal que são poucos os verdadeiros repórteres, aqueles que respiram imparcialidade, que defendem as suas fontes com a vida e que habitualmente estão sempre no sítio errado à hora certa. Eu nunca cheguei a ser a repórter que sonhei um dia ser, mas enquanto fui jornalista respeitei sempre o meu "métier" e tentei, na melhor das minhas intenções, fazê-lo respeitando o leitor. Em consciência pensava "se o leitor não acreditar no que lhe escrevo, dizendo-lhe eu que é a pura das verdades, então vai acreditar em quem!?"

Hoje, defeito meu, continuo a ler os jornais como se fossem o último reduto da verdade.

Há uns dias morreram 700 refugiados no Canal da Sicilia. A tragédia fez capa no Jornal i com o título "Esta vida vale o mesmo que a nossa". Belíssima capa, título extraordinário. Chamada de atenção a uma tragédia recorrente nos jornais italianos e na vida quotidiana do Sul de Itália. 

Horas depois fico a saber que a fotografia já tinha sido capa da edição espanhola da revista "Refugiados" da ACNUR - Agência da ONU para Refugiados em 2007. Depois de passar os olhos por toda a edição eis-me na ficha técnica da mesma a tirar a prova dos 9. A legenda diz "Guardas costeiros resgatam um emigrante ou refugiado ao largo da Costa Sul de Espanha - Reuters/A.Meres/Esp.2002".

A.Meres aka Tony Meres é um foto-jornalista que hoje, no seu blogue, referiu a foto que fez em 2002 como tendo sido utilizada para a capa do Jornal português.
A capa do Jornal i não faz referência à realidade factual da imagem em questão. 

Não bastava a hipocrisia de saber que há pelo menos 12 anos que se morre no Mediterrâneo a fugir de terras madrastas...agora também fiquei a saber que o respeito pela actualidade não existe e que o desrespeito pelo Arquivo atingiu a imensurabilidade. 
Triste capa esta.


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